sexta-feira, 6 de setembro de 2013

As leituras de Charlie



Não há razão alguma para eu escrever uma resenha sobre As vantagens de ser invisível. Então calma, que não é isso. 

Stephen Chbosky escreveu um livro perfeito e eu odeio dizer isso, porque soa errado e infantil, mas é assim que me sinto em relação a essa narrativa tão pessoal, tão franca, tão frágil, mas tão forte e sólida. É lindo, e lindo a ponto de eu querer engolir.

Mas, porém, contudo, toda via, me senti um pouco frustrada com relação às leituras que o professor Bill indica. Só tinha lido Hamlet, e sabia mais ou menos alguma coisa sobre todos os outros – menos Separate Peace e The Fountainhead que foi, tipo, “de onde saiu isso?”. Chocante, eu sei. 

Mas também é intrigante a forma como essas leituras são inseridas no livro, porque fiquei com a impressão que Chbosky não quis, deliberadamente, falar sobre elas. É como se ele fizesse apenas uma leve apresentação, em alguns casos nem o nome dos autores ele menciona. Bill, quando entrega os livros à Charlie, não dá nenhum direcionamento de leitura, ele realmente deixa o Charlie decidir por si próprio o que pensar sobre cada livro. E o Charlie, malucamente, não tece nenhum comentário relevante sobre os mesmos. Seria vazia e desnecessária a presença desses livros na história, se os livros citados não fossem basilares para a literatura ocidental e se a falta de opiniões não refletisse o imenso respeito que o autor tem pelos: 1) leitores, que vão ler e decidir, como o Charlie, se gostam ou não gostam, sem carregar o peso da tradição e do cânone nas costas; 2) pela literatura, essa velha safadinha que insiste em ser relevante de geração à geração.

Então agora, segue os livros e as impressões de Charlie. Inspirem-se:

“To Kill a Mockingbird” ou “O Sol é para Todos”, de Harper Lee.
Segundo Charlie: Se você ainda não leu, acho que deve, porque é muito interessante. Agora [esse] é meu livro favorito, mas sempre acho que um livro é meu favorito até eu ler outro.

“This Side of Paradise” ou “Este Lado do Paraíso”, de F. Scott Fitzgerald.
Na primeira conversa com Sam e Patrick:
- E seu livro favorito?

- “Este lado do paraíso”, do Scott Fitzgerald.

- Por quê?

- Porque foi o ultimo que li.

Isso fez eles rirem, porque sabiam que eu estava sendo sincero, não estava me exibindo.

“Peter Pan”, de J. M. Barrie.
É estranho, porque às vezes eu leio um livro e acho que sou a pessoa do livro. Aliás, o livro que Bill me deu era “Peter Pan”, de J.M. Barrie. Eu sei o que você está pensando. O Peter Pan dos desenhos com os garotos perdidos. O livro é muito melhor do que isso. É sobre esse garoto que se recusa a crescer, e quando Wendy cresce, ele se sente traído. Pelo menos foi o que eu entendi. Acho que Bill me deu o livro para me ensinar alguma lição. A boa noticia é que eu li o livro e, por causa de sua natureza fantástica, não fingi que estava no livro. Assim eu consegui participar e ainda assim ler.

“The Great Gatsby” ou “O Grande Gatsby”), de F. Scott Fitzgerald.

 “A Separate Peace” ou “Uma Ilha de Paz”), de John Knowles.

Aliás, eu ainda não lhe falei do Bill. Mas acho que não há muito a dizer, porque ele continua me dando livros que não dá aos alunos dele, e eu continuo lendo os livros, e ele continua me pedindo para escrever trabalhos, e eu faço. No mês passado, por aí, li “O grande Gatsby” e “A Separate Peace”. Estou começando a ver uma tendência no tipo de livro que o Bill me dá para ler. E, como as fitas de músicas, é maravilhoso colocar cada um deles na palma da minha mão. Todos são meus preferidos. Todos.

“The Catcher in the Rye” ou “O Apanhador no Campo de Centeio”), de J. D. Salinger.
Bill me deu um livro para ler durante as férias. “O apanhador no campo de centeio”. Era o livro favorito de Bill quando ele tinha a minha idade. Ele disse que era o tipo de livro feito para nós. Li as primeiras vinte páginas. Não sei como me senti em relação a ele, mas parecia apropriado naquele momento.

(...)

Um dia depois de ter escrito para você, terminei “O apanhador no campo de centeio”. Desde então, li o livro três vezes. Não sei bem que outra coisa posso fazer. (...). Li o livro de novo nesta noite porque sabia que, se não o fizesse, provavelmente começaria a chorar novamente. O do tipo aterrorizado, eu quero dizer. Li até que fiquei completamente exausto e tive de ir dormir. Pela manhã, terminei o livro e depois comecei imediatamente a lê-lo de novo. Qualquer coisa para não sentir vontade de chorar.

“On the Road” ou “Pé na Estrada”, de Jack Kerouac.

Bill me disse que eu estava me “desenvolvendo” em um ritmo rápido e me deu um livro diferente como uma “recompensa”. É “Pé na estrada”, de Jack Kerouac.

(...)

“Pé na estrada” é um livro muito bom. Bill não me pediu para escrever um trabalho sobre ele porque, como eu disse, era “uma recompensa”.

“Naked Lunch” ou “Almoço Nu”, de William S. Burroughs.
Comecei a ler [Naked Lunch] quando cheguei em casa e, para dizer a verdade, não sei do que o cara está falando. Nunca disse isso ao Bill. Sam me disse que William Burroughs escreveu o livro quando usava heroína e que eu devia “seguir o fluxo”. Então foi o que eu fiz. Ainda não tenho a menor ideia do que ele estava falando, e então desci as escadas para ver televisão com minha irmã.

(...)

Já li cerca de um terço do livro e até agora está muito bom.

Depois que terminei, fiquei deitado na cama olhando para o teto e sorri, porque o silêncio era muito legal.

(...)

 Bill me disse que tinha me dado o livro porque tinha terminado recentemente com a namorada e estava se sentindo filosófico.

“Walden”, de Henry David Thoreau.
Depois comecei a ler o livro que Bill me deu. Era “Walden”, de Henry David Thoreau, o livro favorito da namorada do meu irmão, então fiquei muito animado para ler.

Escrevi um trabalho sobre “Walden” para Bill, mas desta vez fiz diferente. Escrevi um relato do livro. Escrevi um relato fingindo que eu mesmo havia ficado na margem de um lago por dois anos. Eu fingi que vivia da terra e tinha insights. Para falar a verdade, acho que gostaria de fazer isso agora mesmo.

“Hamlet”, de William Shakespeare.
Bill me deu “Hamlet” para ler no feriado. Ele disse que precisaria de tempo livre para me concentrar na peça. Acho que não preciso dizer quem a escreveu. O único conselho que Bill me deu foi para considerar o personagem principal como os outros personagens dos livros que eu tinha lido até então. Ele disse para eu não cair na armadilha de achar que a peça era “fantasiosa demais”.

(...)

Passei o feriado todo lendo “Hamlet”. Bill estava certo. Era muito mais fácil pensar no cara da peça como os outros personagens que eu já havia lido. Também foi útil para mim quando pensei no que havia de errado comigo. Não me deu nenhuma resposta, mas me ajudou a compreender que outra pessoa havia passado por isso. Especialmente alguém que viveu há tanto tempo.


“The Stranger” ou “O Estrangeiro”, de Albert Camus.
Fui para casa e comecei a ler o novo livro que Bill me deu. É chamado “O Estrangeiro”. Bill disse que é “muito fácil de ler, mas difícil de ler bem”. Não tenho ideia do que ele quis dizer, mas até agora estou gostando do livro.

“The Fountainhead” (“A Nascente”), de Ayn Rand.
Então, na escola, Bill me deu o ultimo livro do ano para ler. Chama-se “The Fountainhead”, e é muito grosso. Quando me deu o livro Bill disse: “Seja cético a respeito deste aqui. É um grande livro. Mas procure ser um filtro e não uma esponja”. Às vezes, acho que Bill se esquece que só tenho dezesseis anos.

(...)

 “The fountainhead” é um livro muito bom. Espero estar sendo um filtro.

(...)

Terminei “The Fountainhead”. Foi uma experiência maravilhosa. É estranho descrever a leitura de um livro como uma experiência maravilhosa, mas foi o que eu senti. É um livro diferente dos outros, porque eu não estava sendo um garoto. E não foi como “O Estrangeiro” ou “Naked Lunch”, embora eu ache que foi de certa forma filosófico. Mas não foi como se você tivesse que pesquisar filosofia. Foi mais simples, eu acho, e a melhor parte é que eu peguei o que a autora escreveu e adaptei à minha vida. Talvez seja isso o que significa ser um filtro. Não tenho certeza.

E sim, claro, o método de leitura do Charlie:
“O professor me disse para ler alguns capítulos de cada vez, mas eu não gosto de ler os livros dessa forma. Leio logo metade dele na primeira vez. E gosto de ler os livros duas vezes.”

Com isso está inaugurada a “Série de leituras do Charlie”, que pretendo fazer sem pressão, porque assim é mais divertido.

5 comentários:

  1. Oi, Maira!

    Eu também nunca tinha ouvido falar de "Uma Ilha de Paz" e de "A Nascente" e gostei da forma como o Chbosky introduziu esses livros clássicos em sua obra. Como você disse, ler sem pressão é bem mais divertido.
    Maaaaaaaas... se você quiser ler e conversar com outras pessoas que leram esses livros, venha participar com a gente do Charlie's Booklist. Todo mês a gente lê e discute um livro da lista do Charlie. Está sendo bem legal. O livo de setembro é "Almoço Nu". Apareça ;)
    Link do projeto: http://www.conversacult.com.br/2012/12/charlies-booklist-2013-as-vantagens-de.html
    Link do grupo no Facebook (onde a gente faz votação das datas de discussão e conversa com outros participantes): https://www.facebook.com/groups/464269303621514/

    beijo!

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    1. Poxa Michelle, que legal. Fui ver e o grupo parece ótimo, mas já está acabando, né? Foi um ano de "leituras do Charlie". Acho que não vou poder participar porque ainda tenho que comprar "Almoço Nu" e setembro está lotado, rs. Estou lendo "Os Embaixadores", quero ler "Tenda dos Milagres" e "Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios", mas fiquei tentada. Baixei o PDF e vou tentar me organizar :D
      Bjs

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  2. Oi, Maira!

    Eu também, assim como a Michelle, não conhecia "Uma Ilha de Paz" e "A Nascente", do Fitzgerald conhecia apenas Gatsby, os outros conhecia por nome mas nunca tive muito interesse em ler até que conheci o Charlie's Booklist que a Mi está participando, mas eu desisti do desafio por quis participar de vários desafios esse ano e estava ficando sem ânimo para ler por que estava lendo tudo por 'pressão', sabe, 'eu preciso ler' e não estava sendo legal...
    Ano que vem, após conseguir adquirir todos os livros, pretendo também fazer as leituras do Charlie, como você disse: "sem pressão" para ser mais divertido ^^

    :*

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  3. Eu nem me atrevo mais a me inscrever em desafios, geralmente abandono e isso me deixa com uma sensação de falta de compromisso horrível. Te entendo perfeitamente!
    beijo grande

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  4. Que desafio interessante! Li várias das indicações, o que está me deixando com siricutico de ler As vantagens de ser invisível. Sabe que tenho A Nascente lá em casa? Dois volumes gigantescos de uma filósofa muito lida nos Estados Unidos. E curiosamente, já recebi dois alertas para lê-lo com desconfiança. Qual pegar primeiro? As vantagens ou os calhamaços de Ayn Rand?

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